Brasília – 19/08/2025. A determinação do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), que veda a aplicação no país de leis ou decisões estrangeiras não homologadas pela Justiça brasileira ou por tratados internacionais, colocou o sistema bancário nacional diante de um conflito inédito: cumprir a orientação da Corte ou obedecer às sanções impostas pelos Estados Unidos ao ministro Alexandre de Moraes com base na Lei Magnitsky.
Dilema operacional
Desde 30 de julho, quando Moraes foi incluído na lista do Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros (Ofac), as instituições financeiras brasileiras começaram a restringir operações em dólar, cartões de bandeira norte-americana e investimentos vinculados ao mercado dos EUA. A decisão de Dino, divulgada na segunda-feira (18), ampliou a incerteza ao reforçar que nenhuma medida estrangeira tem validade automática em território nacional.
A constitucionalista Vera Chemim avalia que o cumprimento da ordem do STF pode inviabilizar a atividade bancária. “A maior parte das transações desses bancos passa pelo sistema americano; se ignorarem o Ofac, correm risco de multas bilionárias ou de perder o acesso ao mercado”, afirma.
Para o advogado André Marsiglia, o setor tende a adotar uma postura pragmática. “A dependência do sistema financeiro norte-americano deve levar as instituições a seguir a legislação dos EUA, mesmo diante da possibilidade de serem acusadas de descumprir decisão do Supremo”, diz.
Risco de sanções e multas
A experiência recente demonstra a rigidez do Tesouro e do Departamento de Justiça norte-americanos. Em julho de 2025, a corretora Interactive Brokers LLC foi multada em US$ 11,83 milhões por violações que incluíam negociações com entidades enquadradas no Regime Global Magnitsky. Em dezembro de 2024, um indivíduo recebeu penalidade de US$ 45,1 mil por seis transferências a pessoa bloqueada.
O Banco do Brasil, que administra parte da folha de pagamento do STF e mantém operações nos EUA, é visto como o caso mais sensível. Caso descumpra ordens do Ofac, o banco público de capital aberto pode ter de encerrar suas atividades no mercado norte-americano. Em nota, a instituição afirmou atuar “em conformidade com a legislação brasileira, normas internacionais e regras dos mais de 20 países onde está presente”.
Origem da decisão
A manifestação de Dino deriva de ação movida pelo Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) sobre processos na Inglaterra relacionados ao desastre de Mariana (MG) em 2015. O ministro reiterou entendimento aprovado pelo plenário do STF em 2023 de que sentenças estrangeiras só produzem efeitos no Brasil após homologação.

Imagem: André Borges
Ao justificar a medida, Dino citou “ameaças à soberania nacional” e criticou a imposição de sanções unilaterais. Já o Escritório de Assuntos do Hemisfério Ocidental do Departamento de Estado dos EUA declarou na rede X que “nenhum tribunal estrangeiro pode invalidar as sanções dos Estados Unidos”, classificando Moraes como “tóxico” para empresas e indivíduos que queiram acessar o mercado americano.
Próximos passos
Especialistas como Gabriel Santana, do Grupo GSV, preveem uma onda de ações judiciais de bancos para comprovar a necessidade de seguir a legislação norte-americana a fim de preservar suas operações. Advogados também alertam para possíveis retaliações que poderiam congelar bilhões de dólares de instituições brasileiras no exterior.
Enquanto isso, o setor financeiro aguarda posições formais do Banco Central e do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) sobre a execução das sanções, ciente de que qualquer escolha pode acarretar perdas expressivas ou até a interrupção de atividades internacionais.
Com informações de Gazeta do Povo