Washington, 17 de agosto de 2025 – O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, exigiu que a China quadruplicasse “o mais rápido possível” as importações de soja norte-americana, abrindo um novo capítulo na disputa pelo maior mercado consumidor da commodity, atualmente dominado pelo Brasil.
Tarifas recordes e trégua provisória
O pedido foi divulgado em 10 de agosto, quatro dias depois da entrada em vigor de tarifas de 50% impostas por Washington sobre produtos brasileiros. A declaração ocorreu a dois dias do fim da trégua de 90 dias acertada em 12 de maio entre EUA e China, acordo que reduziu temporariamente as alíquotas aplicadas por ambos os países – de 145% para 30% no lado norte-americano e de 125% para 10% no lado chinês. No dia seguinte ao apelo de Trump, as partes prorrogaram o período de redução tarifária até 12 de novembro.
Dependência chinesa do grão importado
A China responde por 61,1% de todas as aquisições mundiais de soja, destinadas principalmente à produção de ração para suínos e aves. Apenas 15% da demanda interna é suprida por plantações locais; os restantes 85% dependem do mercado externo.
Em 2024, o país asiático desembolsou US$ 52,8 bilhões para importar 105,03 milhões de toneladas. O Brasil forneceu 74,6 milhões de toneladas (71,1%), enquanto os EUA ficaram com 22,1 milhões (22%). Argentina e Uruguai ocuparam o terceiro e quarto lugares, com 4,1 milhões (3,9%) e 2,02 milhões (1,9%) de toneladas, respectivamente.
Governo brasileiro vê risco político
Embora Trump não tenha citado o Brasil, analistas avaliam que uma expansão das vendas norte-americanas diminuiria a fatia brasileira no mercado chinês. “Os EUA hoje não têm condição de quadruplicar suas exportações, mas o grão pode ser moeda de troca nas negociações”, afirma Alberto Pfeifer, pesquisador sênior do Insper Agro Global.
Para Celso Amorim, assessor especial da Presidência, o gesto de Trump “beira um estado de guerra contra o Brasil”, pois tentaria deslocar o concorrente por meio de pressão política, não apenas por competitividade comercial.
Lula e Xi reforçam parceria
Um dia antes das declarações de Amorim, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva conversou por telefone com Xi Jinping. Segundo o Palácio do Planalto e a agência estatal Xinhua, ambos reafirmaram o alinhamento estratégico e sinalizaram ampliar cooperação em saúde, petróleo, gás, economia digital e satélites.
Brasil e EUA trocam posições desde 2018
Os Estados Unidos lideravam o fornecimento de soja à China até 2012. A partir de 2013, o Brasil ultrapassou o concorrente e consolidou-se como principal exportador em 2018, quando a guerra comercial iniciada no primeiro mandato de Trump levou Pequim a sobretaxar grãos norte-americanos. Nesse ano, o Brasil chegou a 75,1% do mercado chinês; os EUA recuaram para 18,9%.

Imagem: criada utilizando Dall-E
Em 2020, o acordo de “Fase Um” entre Washington e Pequim previa que a China comprasse US$ 40 bilhões anuais de soja norte-americana por dois anos, meta que ficou em torno de 73% cumprida.
Safra reservada e diferença de preço
Até o momento, importadores chineses fecharam compras de cerca de 8 milhões de toneladas de soja sul-americana para embarque em setembro e 4 milhões para outubro – metade da necessidade prevista para o mês. Em 2024, no mesmo período, já havia 7 milhões de toneladas contratadas dos EUA. Embora ainda pese uma tarifa de 23% sobre o grão norte-americano, lotes para outubro estão cerca de US$ 40 por tonelada mais baratos que os brasileiros sem a taxa.
Segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, 73,4% da soja exportada pelo Brasil em 2024 tiveram a China como destino, correspondendo a 9% de toda a receita externa obtida pelo país com vendas de bens.
O impasse tarifário manterá a disputa aberta nos próximos meses, enquanto Washington e Pequim tentam chegar a um acordo definitivo e o Brasil busca preservar o espaço conquistado no maior mercado de soja do planeta.
Com informações de Gazeta do Povo