A combinação de juros internos elevados e a nova rodada de tarifas impostas pelos Estados Unidos empurra as empresas brasileiras para um cenário de inadimplência sem precedentes. Dados da Serasa Experian mostram que, em maio de 2025, as dívidas com mais de 90 dias de atraso atingiram R$ 182,4 bilhões, o maior nível desde 2016.
Um terço das empresas em atraso
Ao todo, 7,7 milhões de companhias — cerca de um terço dos CNPJs ativos — estavam inadimplentes no mês de referência. Cada negócio acumula, em média, 7,3 contas vencidas, marca que consolida o quinto recorde mensal consecutivo.
Crédito encarecido pela Selic de 15%
A taxa básica de juros, fixada em 15% ao ano, deve permanecer nesse patamar até o fim de 2025 e recuar apenas gradualmente a partir de 2026, segundo projeções do mercado. O custo elevado do crédito já se reflete nos balanços dos bancos. Levantamento da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) indica que o ritmo de expansão da carteira de crédito desacelerou de 11,9% em junho para 11,3% em julho. A entidade estima que a inadimplência na carteira de recursos livres se manterá em 5% em 2025 e 2026, acima do nível de 2024.
Tarifa média de 30,9% para produtos brasileiros
Em meio à restrição doméstica, o protecionismo norte-americano agrava a situação. Cálculos do BTG Pactual apontam que a tarifa média aplicada aos produtos brasileiros subiu para 30,9%, trinta vezes maior que o índice anterior. Análise da Confederação Nacional da Indústria (CNI) revela que 77,8% da pauta exportadora para os EUA agora está sujeita a algum tipo de taxação e mais da metade dos embarques enfrentará sobretaxas de 50%.
O efeito cascata atinge toda a cadeia. “O aumento tarifário gera um choque direto no capital de giro das exportadoras, que se espalha para fornecedores de insumos, transportadoras e prestadores de serviços”, explica Silvano Boing, CEO da Global, maior recuperadora de crédito empresarial do país.
Impacto potencial de R$ 25,8 bilhões no PIB
Estudo da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) estima perda de R$ 25,8 bilhões no Produto Interno Bruto em até dois anos. A Fundação Dom Cabral calcula que cerca de 10,8 mil exportadoras de médio porte serão diretamente afetadas.
MPMEs concentram 90% da inadimplência
Do total de empresas negativadas, 7,3 milhões são micro, pequenas e médias, responsáveis por aproximadamente 90% do volume inadimplente. O setor de serviços lidera com 53,7% das ocorrências, seguido por comércio (34,1%) e indústria (8%). No varejo, negócios de margens estreitas já revisam planos de expansão, segundo o Centro de Excelência em Varejo da FGV.

Imagem: José Cruz
“Muitas dessas empresas já operavam no limite antes do tarifaço”, afirma Leandro Turaça, sócio-gestor da Ouro Preto Investimentos. Para Camila Abdelmalack, economista da Serasa Experian, a dificuldade de acesso a novo financiamento deve ampliar pedidos de recuperação judicial e falências.
Recuperação de crédito exige rapidez
Carlos Ottoni, sócio da KPMG, recomenda ações imediatas, como busca de novos mercados, renegociação de contratos e redução de custos. Estatísticas da Associação Nacional de Bureaus de Crédito (ANBC) reforçam a urgência: 82% das dívidas B2B são recuperadas quando negociadas nos dez primeiros dias de atraso; após 180 dias, o índice cai para 12%.
Com a manutenção dos juros elevados e o impacto das tarifas norte-americanas sobre as exportações, analistas consideram que a trajetória de alta da inadimplência corporativa deve persistir pelo menos no curto prazo.
Com informações de Gazeta do Povo