Empresas emergentes do Vale do Silício voltadas à inteligência artificial estão retomando o modelo de trabalho “996” — expediente das 9h às 21h, seis dias por semana, somando 72 horas — apesar de esse formato ter sido considerado ilegal na China em 2021.
Reportagem da revista Wired mostra que companhias da Bay Area vêm exigindo dos novos contratados a adesão explícita a longas jornadas. A Rilla, startup de IA sediada em Nova York, avisa em anúncios de emprego que só deve se candidatar quem estiver disposto a atuar aproximadamente 70 horas semanais, de forma presencial.
Will Gao, diretor de crescimento da Rilla, afirmou à publicação que uma parte da geração Z foi influenciada por histórias de empreendedores como Steve Jobs e Bill Gates, que teriam dedicado a vida às empresas que fundaram. Segundo ele, quase todo o quadro de 80 funcionários cumpre a escala 996.
Pressão por eficiência
O ritmo acelerado ganhou fôlego após sucessivas demissões em massa no setor de tecnologia e pela corrida global em torno da IA. Em fevereiro, Sergey Brin, cofundador do Google, recomendou que a equipe do projeto Gemini estivesse no escritório “todos os dias” e citou 60 horas semanais como patamar ideal de produtividade.
Outros líderes do setor compartilham a visão de intensificar o trabalho. Elon Musk, em novembro de 2022, declarou aos remanescentes do então Twitter que aderissem a uma cultura “extremamente hardcore” ou deixassem a empresa. Mark Zuckerberg também enfatiza que a eficiência dos times é prioridade, mesmo com horas extras.
Disputa com a China
A adoção do 996 nos Estados Unidos é justificada, em parte, pela necessidade de competir com empresas chinesas de IA. A DeepSeek, por exemplo, lançou recentemente um modelo comparável às principais ofertas norte-americanas, elevando a pressão por resultados.
Paradoxalmente, o próprio governo chinês proibiu a prática em 2021, quando o Supremo Tribunal Popular e o Ministério de Recursos Humanos e Segurança Social consideraram o 996 ilegal durante campanha para reduzir desigualdades e conter o poder das gigantes de tecnologia.

Imagem: infomoney.com.br
Debate chega à Europa
A discussão sobre jornadas prolongadas também alcançou o ecossistema europeu de startups. Em junho, o investidor Harry Stebbings, fundador do fundo 20VC, escreveu no LinkedIn que “sete dias por semana” é o ritmo necessário para competir globalmente. A publicação gerou críticas de empreendedores que apontam risco de esgotamento.
Ivee Miller, sócia geral da Balderton Capital, respondeu que burnout está entre as três principais causas de falência de startups em estágio inicial, argumentando que defender o 996 é “um mau motivo” para investir.
Apesar dos alertas, a tendência de ampliar a carga de trabalho segue ganhando adeptos entre fundadores que veem nas 72 horas semanais uma forma de acelerar produtos de IA e buscar liderança mundial no setor.
Com informações de InfoMoney