O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pretende retomar grandes projetos hidrelétricos e estuda erguer uma usina binacional na fronteira com a Bolívia, aproveitando o potencial do Rio Madeira. Anunciada em agosto pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, a ideia busca repetir o modelo da hidrelétrica de Itaipu, construída entre 1975 e 1982.
Ceticismo técnico e econômico
Especialistas questionam a proposta. Para o engenheiro e economista Erik Duarte Rego, o empreendimento tem caráter político e oferece poucas vantagens ao Brasil. Ele aponta custos “expressivos” e falta de clareza sobre benefícios concretos.
Obra complexa na Amazônia
A localização na Amazônia eleva o orçamento devido às dificuldades de transporte, acesso restrito e longos períodos de chuva. Exigências ambientais também pressionam o valor final.
As linhas de transmissão representam outro desafio. Quando as usinas de Santo Antônio e Jirau foram construídas, o gasto para levar a energia ao Centro-Sul ficou próximo do valor de uma das próprias usinas. Caso a infraestrutura existente não suporte a nova carga, serão necessárias estruturas adicionais de alto custo.
Produção sujeita ao regime de chuvas
A tendência atual é usar o modelo “fio d’água”, que dispensa grandes reservatórios. Nesse formato, a geração depende diretamente das chuvas e pode cair a níveis baixos ou mesmo zerar na estiagem, encarecendo a energia.
Segundo Rego, combinações de fontes eólica, solar e biomassa alcançam potência semelhante por valores menores. “Para construir uma hidrelétrica hoje é preciso subsídio e vontade política”, afirmou.
Lembrança do Gasoduto Bolívia-Brasil
O histórico de cooperação energética com a Bolívia reforça o receio de riscos políticos. O Gasoduto Bolívia-Brasil (Gasbol), iniciado em 1997 e operacional a partir de 1999, passou por turbulência em 2006, quando o então presidente Evo Morales nacionalizou o setor de petróleo e gás e ocupou refinarias da Petrobras. Em 2007, novo acordo elevou em cerca de US$ 100 milhões anuais o custo do gás para o Brasil, enquanto a Bolívia indenizou a Petrobras em US$ 112 milhões.

Imagem: Gazeta do Povo com ChatGPT
Quem paga a conta?
Rego calcula que o reservatório da usina ficaria integralmente em território boliviano, cabendo ao Brasil financiar a maior parte da obra e fornecer conhecimento técnico, já que a Bolívia, país de menor porte econômico, teria margem limitada para aportar recursos.
A advogada Isabela Ramagem, especialista em energia e sócia do Caputo, Bastos e Serra Advogados, vê possibilidade de participação boliviana. Ela lembra que o país opera grandes hidrelétricas, como San José 1 e San José 2, e conta com apoio do Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF) para novos projetos.
Para o mercado e para os contribuintes, a incerteza permanece: os potenciais ganhos estratégicos compensam os altos custos e o histórico de instabilidade?
Com informações de Gazeta do Povo