Novas mensagens de WhatsApp da antiga equipe do ministro Alexandre de Moraes no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) indicam que o tribunal produziu certidões sigilosas para classificar manifestantes presos após os atos de 8 de janeiro de 2023. Nos documentos, integrados por postagens antigas de redes sociais, os detidos eram rotulados como “positivos” ou “negativos”. “Certidão positiva” correspondia a conteúdo considerado antidemocrático pela Assessoria Especial de Enfrentamento da Desinformação (AEED), criada em 2022.
Os diálogos vieram à tona nesta segunda-feira (4) em reportagem dos jornalistas David Ágape e Eli Vieira. Eles mostram que as certidões eram produzidas às pressas, sob reclamações dos responsáveis, e reuniam, em muitos casos, apenas manifestações políticas dos investigados ou de terceiros.
Quem elaborava os dossiês
Um dos autores das certidões era o perito Eduardo Tagliaferro, então chefe da AEED. Ele se tornou alvo de inquérito no Supremo após o vazamento das conversas conhecidas como “Vaza Toga”, que expuseram ações de monitoramento de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro nas redes.
Exemplos de certidões positivas
Claudiomiro da Rosa Soares – Motorista de trator preso dentro do Supremo em 8/1. A AEED considerou antidemocráticas estas postagens:
- Compartilhamento de vídeo em que Lula é vaiado no velório de Pelé (3.jan.23) com a frase “esse é presidente de 60 milhões de votos” e emojis de riso;
- Vídeo do ministro Luís Roberto Barroso votando a favor da Lava Jato, acompanhado do comentário “tudo comprado; quanto custou aos ministros, e os demais, calarem a boca?????”;
- Vídeo de manifestante fardado em frente a quartel do Exército (dez.22) com o texto “Eu decidi lutar! E você?”;
- Reportagem sobre supostas vulnerabilidades das urnas eletrônicas, com o comentário “Segundo o cabeça de ovo, ninguém pode questionar?”.
Claudiomiro permaneceu em prisão preventiva até 15.dez.23 e responde no STF por associação criminosa armada, tentativa de golpe de Estado, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
Adenilson Demetrio – Pedreiro preso em 9.jan.23 no acampamento em frente ao Quartel-General do Exército. A certidão apontou um tuíte de 30.jul.22 com link para o “Manifesto à Nação Brasileira – Em Defesa da Liberdade”, assinado por advogados favoráveis a Bolsonaro e críticos às decisões de Moraes sobre fake news. Ele é réu por associação criminosa e incitação das Forças Armadas.
Ademir da Silva – Artesão detido no QG do Exército. Foi enquadrado por uma única imagem no Instagram com a frase “fazer cumprir a Constituição não é golpe!”, a capa da Constituição e foto de Ulysses Guimarães. Firmou acordo com a Procuradoria-Geral da República, recebeu pena de 225 horas de serviço comunitário e multa.

Imagem: Marcello Casal Jr via gazetadopovo.com.br
Ademir Domingos Pinto – Vendedor ambulante também preso no QG. A AEED usou posts de junho e julho de 2018 com críticas a Lula e ao PT para classificá-lo como antidemocrático. Ele firmou acordo semelhante ao de Ademir da Silva, com 225 horas de serviços e multa.
Situação dos documentos
As certidões produzidas pela AEED continuam sob sigilo no TSE. Segundo as mensagens divulgadas, o material era confeccionado rapidamente para embasar pedidos de prisão ou medidas cautelares contra os investigados.
As novas revelações integram o relatório “Arquivos do 8 de Janeiro: por dentro da força-tarefa judicial secreta para prisões em massa”, publicado em 4 de agosto de 2025.
Com informações de Gazeta do Povo